Por ocasião da festa de aniversário da Sociedade Recreativa Artística Barranquense, que decorreu no passado dia 18 de maio, foi lido o texto abaixo publicado na íntegra, que conta a história da coletividade na primeira pessoa:
(...)100º Aniversário da Sociedade Recreativa Artística Barranquense
Boa tarde a
todos.
Dispenso a minha
apresentação porque todos vós sabem quem sou.
Mas para aqueles
que ainda não me conhecem bem… Sou a Sociedade Recreativa Artística
Barranquense, fundada em 31 de Maio de
1919, faço nesta data o meu 100º. Aniversário, por um grupo de jovens corajosos
cujo nomes passo a discriminar: Francisco Henrique Guerra, Manuel Santinho Dourado, José Manuel Ramos Rodrigues,
José Lopes Fialho, Augusto do Carmo Xarrama, Francisco Fialho (?), João Caeiro
Tereno António Rodrigues Alves, António Lopes Ferreira, António Balsas Escoval,
Manuel Fernandes Pinto, António Mendes Guerreiro, André Fialho Gomes, Alfredo
Monteiro, Manuel Vaz, Clemente Alves Marques e João António Escoval
(?), jovens estes que não olhando a meios pensaram e bem, que sentindo a
necessidade de unir todos os barranquenhos a minha volta, em todas as estações
do ano, sentados à braseira de picão no Inverno, decidiram gerar-me com a
criação de sócios para confraternizar criando espaço para vários eventos tais
como jogos de mesa, bilhar, bailes, com frequência em dias festivos, e o
tradicional baile da pinha, etc..
Lamentando não
poder dar-vos mais dados desde a minha existência pois apenas possuo, poucos,
desde 1930, eis que em 1 de Outubro de 1943 em Assembleia Geral Extraordinária,
na sala de sessões da S.R.A. Barranquense a Direção de então propôs modificar
alguns dos artigos dos Estatutos desta Sociedade cujos artigos foram submetidos
à votação na dita Assembleia, sendo aprovados por maioria a alteração em
questão. Desta Assembleia resultou a ata nº. 58 de 6/10/1943 que
foi assinada pelos membros da mesa: Secretário:- José Leal Pinto e
Vice-Presidente:- Domingos Fernandes Fretes.
Os Sócios
proponentes para esta alteração foram: André Rodrigues da Silva, Celestino da
Silva Coelho, Daniel Caetano Durão, Domingos Fernandes Fretes, José Gomes
Alcario, António Alves Gabriel, Manuel Varela Mendes, Francisco Costa,
Francisco Ramos Bossa, Manuel Santinho Mendes, (Assinatura ilegível), Luís
Rodrigues Godinho, Francisco Gomes Alcario, Francisco Vasques Pica Júnior e
Domingos Fialho Pelicano
Por algumas vicissitudes
passei mas com a força e o querer dos atrás referidos conseguiram que fosse o
que hoje sou.
Fui criada na, hoje, Rua das Forças Armadas,
nº 25
Passaram-me para a, hoje, Rua das Forças
Armadas nº 11
E por último na
Praça da Liberdade onde me encontro.
Não foi fácil.
Tempos muito conturbados com a implantação da República havia 9 anos e os
acontecimentos eram constantes com graves tensões sociais e politicas em todo o
país que culminou com o regime totalitário. Os meus amigos trabalhadores rurais,
a grande maioria, que, depois de um dia de canseira com labuta dura travada
durante o dia, trabalhando de sol a sol, ainda lhes restavam umas forças para
se dirigirem ao pé de mim para entre eles dialogarem e desabafarem a labuta do
dia- a- dia travadas e aguentando todas as intempéries vencendo as adversidades
que se lhes deparavam à medida que os dias passavam. Gente humilde, forte,
gente de querer que nunca viraram a cara aos caprichos da vida, reuniam-se à
minha volta cada um apresentava as suas queixas ou alegrias sobre o trabalho do
campo, seareiros, artífices e outros, que o tinham, ou entre aqueles que não o
tinham apresentavam as suas tristezas, lamentações, a forma como arranjar
trabalho ganhando umas migalhas para dar de comer aos seus filhos, etc.
Houve muitas sacudidelas no decorrer do tempo
até que em 1926 foi criada a ditadura que veio a transformar substancialmente o
dia- a- dia da nossa gente.
Mas dizia eu que
tinha poucos dados para vos dar até 1930. É verdade! Mas quando me compraram a
minha terceira casa, pequenina, mas acolhedora, houve em uma Assembleia Geral
de Sócios de 28/12/54 um sócio, José Leal Pinto, que propôs a compra da casa ao
lado que se encontrava a venda para alargar mais a sede em virtude do número de
sócios estar a crescer substancialmente e a Sociedade disponibilizar algum
dinheiro para o fazer.
Em Assembleia
Geral de Sócios de dia 11/3/56 foi colocada a questão aos sócios para votação
da compra ou não do referido prédio sendo reprovado por uma grande maioria. Mas
em Assembleia Geral de Sócios de 8/12/56 foi nomeada a seguinte Direcção:
Presidente:-
Francisco Ramos Bossa
Vice-Presidente:-
Manuel Varela Mendes
Tesoureiro:-
Jorge Garcia Fialho
Secretário:-
Mário Francisco Fernandes Escoval
Vice-Secretário:-
Jacinto Reganha Pica
que, em
Assembleia de 01/03/57 por intermédio do Secretário, Mário Escoval que expôs os
prós e contras em adquirir a casa em questão, se decidiu avançar com a compra da terça parte
da casa ao lado uma vez que a restante foi comprada pelo dono da outra casa contínua
Dr. Figueiredo, cuja obra importava em 135.000,00 escudos mas com a compra da
casa o orçamento aumentou mais 75.000,00 escudos, totalizando 210.000,00
escudos, tendo sido aprovada por
maioria.
Mas eis que com
a obra concluída e inaugurada em 13/04/58 passei a estar nas nuvens graças aquele
punhado de jovens que quiseram atribuir-me este bem-estar.
Obra esta, considerada
no tempo, como a Sociedade maior de todo o Alentejo.
Entretanto, em
16/01/59, depois da obra feita, a Assembleia Geral de sócios dá poderes ao
Tesoureiro Jorge Garcia Fialho para contrair em nome da Sociedade na Caixa
Geral de Depósitos um empréstimo até 100.000,00 escudos com garantia
hipotecária do prédio. Usando da palavra o Secretário Mário Fernandes Escoval
disse que aceitariam a autorização do referido valor mas com a condição de a
mesma Direção se manter em funções até o fim da liquidação da hipoteca, que foi
concedida.
Em 10/05/59 em
Assembleia Geral e uma vez que estava em grande expansão a Televisão, novidade
na nossa terra, a Assembleia debruçou-se sobre este assunto, que, atendendo as
dificuldades financeiras havida com as obras e a compra da casa tornava-se
impossível concretizar os desejos dos sócios. Mas eis que aparece uma proposta
apresentada pelos sócios José Delgado D’Àbrio e António Pedro Sales Peres, em que puseram as condições de que colocavam uma TV usufruindo a
importância de 0,50 cêntimos por sócio que quisessem ver, por dia, durante 2
(dois) anos. Terminado este período a televisão ficava a pertencer
definitivamente a Sociedade tendo sido aprovada na referida Assembleia.
Outros casos
houve… mas fico por aqui e dou voz aos meus seguidores que tracem uma resenha
do que foram os tempos decorridos desde aquelas datas até aos dias de hoje.
Assim, se tempos difíceis eram até aquelas
datas maiores se tornaram a partir desta, segundo os dados que possuímos e são
alguns, os tempos da ditadura só trouxe amarguras em especial para aqueles mais
desfavorecidos, que eram muitos, com a falta de trabalho e o consequente êxodo
emigratório para países da Europa e migrações para Lisboa e periferia e outras
paragens, bem como com a guerra colonial a partir de 1960/61 a nossa juventude
tiveram que deixar o nosso cantinho para servir o estado, originando uma
desertificação acentuada na nossa terra e consequentemente a desistência de
sócios desta coletividade por força das circunstância.
No entanto, os
seus sócios continuaram a honrar o que os nosso antepassados nos legaram e
continuaram teimosamente prevalecendo com a sua beleza o mesmo sentido de
associativismo que nos deixaram.
Nesses tempos,
desde 1958, data da inauguração deste edifício, e restantes eram exibidos no
terraço e no salão da Sociedade, além de bailes e outros eventos, cinemas ambulantes
e com a criação da televisão a Direcção adquiriu uma TV em circunstância atrás
citada para os sócios pagando 50 centavos por sócio até que por força dos
tempos e a criação de outras diversões a nível nacional e local foi-se
deteriorando a permanência dos sócios na Sociedade originando um desinteresse
que cada vez mais se veio notando até que chegou ao ponto de uma inabilidade
tamanha que víamos caminhar a passos largos o seu término sem que houvesse
alguém entre os sócios capazes de tomarem a iniciativa de arrumarem a casa e
honrar aqueles que tudo fizeram por nós.
Até que, também
aqui um punhado de sócios, não tão jovens, como os primeiros, julga-se,
deitaram mãos a obra e fizeram renascer, não direi das cinzas porque não morreu,
mas da situação precária em que se encontrava.
E é aqui que
nesta breve resenha chegamos aos nossos dias.
Não há dúvidas
nenhumas que esta Colectividade é aquilo que os seus sócios querem que ela
seja. Para tanto é necessário que independentemente dos seus credos políticos exerçam
os seus direitos e deveres junto dos Orgãos Sociais que dirigem os destinos
desta Sociedade apresentando opiniões credíveis para torna-la cada vez mais
Sociedade e evitar o seu definhamento, logo, a sua morte, ainda que nesta data
esteja a funcionar em pleno.
Não é isso que
queremos e já foi dito por várias vezes, mas uma SOCIEDADE que HONRE os nosso
antepassados com este imponente legado que nos deixaram.
Para as camadas
jovens que hoje pouco ou quase nada frequentam esta casa pede-se que, também
vós, honrem os vossos antepassados que afinal são pais, irmãos, tios e outros
familiares que já nos deixaram, dignificando-a com iniciativas que certamente
todos vós têm.
PARA OS NOSSOS
ANTEPASSADOS NESTE DIA DO 100º ANIVERSÁRIO DA FUNDAÇÃO DA SOCIEDADE O NOSSO
MUITO OBRIGADO POR TUDO QUANTO NOS DEIXARAM, PRESTANDO-LHES ESTA HOMENAGEM PÓSTUMA COM UM MINUTO DE SILÊNCIO.
PARA OS SÓCIOS ACTUAIS, QUEREMOS SER OS SEGUIDORES DELES E TRANSMITIR AOS VINDOUROS OS DESEJOS
DA CONTINUIDADE DESTA CASA.
BARRANCOS, 13 de
Maio de 2019 - ass) José Peres
Valério, Sócio nº 158
placas comemorativas colocadas na SRAB (Foto: eB, 24-05-2019) |
3 comentários:
Tudo quanto seja história é de guardar porque amanhà pode haver alguém que queira dizer o contrário ou omissão, muito bem o artigos ou artigos são informação para a história de Barrancos e da SRAB em particular. obrigado pela minha parte vou guardar.
Caro Romão
O eB, para além de informar, serve de repositório da memória de Barrancos. Aqui pode encontrar um pouco do que sucedeu em Barrancos, desde 2006. Já lá vão uns anitos.
Abç
Que história tão bonita
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