sexta-feira, 31 de maio de 2019

Um pouco da história da Sociedade dos Rapazes, contada "por ela própria" no dia da festa dos 100 anos

Por ocasião da festa de aniversário da Sociedade Recreativa Artística Barranquense, que decorreu no passado dia 18 de maio, foi lido o texto abaixo publicado na íntegra, que conta a história da coletividade na primeira pessoa:
(...)
100º Aniversário da Sociedade Recreativa Artística Barranquense    
Boa tarde a todos.
Dispenso a minha apresentação porque todos vós sabem quem sou.
Mas para aqueles que ainda não me conhecem bem… Sou a Sociedade Recreativa Artística Barranquense, fundada  em 31 de Maio de 1919, faço nesta data o meu 100º. Aniversário, por um grupo de jovens corajosos cujo nomes passo a discriminar: Francisco Henrique Guerra, Manuel  Santinho Dourado, José Manuel Ramos Rodrigues, José Lopes Fialho, Augusto do Carmo Xarrama, Francisco Fialho (?), João Caeiro Tereno António Rodrigues Alves, António Lopes Ferreira, António Balsas Escoval, Manuel Fernandes Pinto, António Mendes Guerreiro, André Fialho Gomes, Alfredo Monteiro, Manuel Vaz, Clemente Alves Marques e João António Escoval (?), jovens estes que não olhando a meios pensaram e bem, que sentindo a necessidade de unir todos os barranquenhos a minha volta, em todas as estações do ano, sentados à braseira de picão no Inverno, decidiram gerar-me com a criação de sócios para confraternizar criando espaço para vários eventos tais como jogos de mesa, bilhar, bailes, com frequência em dias festivos, e o tradicional baile da pinha, etc..
Lamentando não poder dar-vos mais dados desde a minha existência pois apenas possuo, poucos, desde 1930, eis que em 1 de Outubro de 1943 em Assembleia Geral Extraordinária, na sala de sessões da S.R.A. Barranquense a Direção de então propôs modificar alguns dos artigos dos Estatutos desta Sociedade cujos artigos foram submetidos à votação na dita Assembleia, sendo aprovados por maioria a alteração em questão. Desta Assembleia resultou a ata nº. 58 de 6/10/1943  que  foi assinada pelos membros da mesa: Secretário:- José Leal Pinto e Vice-Presidente:- Domingos Fernandes Fretes.
Os Sócios proponentes para esta alteração foram: André Rodrigues da Silva, Celestino da Silva Coelho, Daniel Caetano Durão, Domingos Fernandes Fretes, José Gomes Alcario, António Alves Gabriel, Manuel Varela Mendes, Francisco Costa, Francisco Ramos Bossa, Manuel Santinho Mendes, (Assinatura ilegível), Luís Rodrigues Godinho, Francisco Gomes Alcario, Francisco Vasques Pica Júnior e Domingos Fialho Pelicano
Por algumas vicissitudes passei mas com a força e o querer dos atrás referidos conseguiram que fosse o que hoje sou.
 Fui criada na, hoje, Rua das Forças Armadas, nº 25
 Passaram-me para a, hoje, Rua das Forças Armadas nº 11
E por último na Praça da Liberdade onde me encontro.
Não foi fácil. Tempos muito conturbados com a implantação da República havia 9 anos e os acontecimentos eram constantes com graves tensões sociais e politicas em todo o país que culminou com o regime totalitário. Os meus amigos trabalhadores rurais, a grande maioria, que, depois de um dia de canseira com labuta dura travada durante o dia, trabalhando de sol a sol, ainda lhes restavam umas forças para se dirigirem ao pé de mim para entre eles dialogarem e desabafarem a labuta do dia- a- dia travadas e aguentando todas as intempéries vencendo as adversidades que se lhes deparavam à medida que os dias passavam. Gente humilde, forte, gente de querer que nunca viraram a cara aos caprichos da vida, reuniam-se à minha volta cada um apresentava as suas queixas ou alegrias sobre o trabalho do campo, seareiros, artífices e outros, que o tinham, ou entre aqueles que não o tinham apresentavam as suas tristezas, lamentações, a forma como arranjar trabalho ganhando umas migalhas para dar de comer aos seus filhos, etc.
 Houve muitas sacudidelas no decorrer do tempo até que em 1926 foi criada a ditadura que veio a transformar substancialmente o dia- a- dia da nossa gente.
Mas dizia eu que tinha poucos dados para vos dar até 1930. É verdade! Mas quando me compraram a minha terceira casa, pequenina, mas acolhedora, houve em uma Assembleia Geral de Sócios de 28/12/54 um sócio, José Leal Pinto, que propôs a compra da casa ao lado que se encontrava a venda para alargar mais a sede em virtude do número de sócios estar a crescer substancialmente e a Sociedade disponibilizar algum dinheiro para o fazer.
Em Assembleia Geral de Sócios de dia 11/3/56 foi colocada a questão aos sócios para votação da compra ou não do referido prédio sendo reprovado por uma grande maioria. Mas em Assembleia Geral de Sócios de 8/12/56 foi nomeada a seguinte Direcção:
Presidente:- Francisco Ramos Bossa
Vice-Presidente:- Manuel Varela Mendes
Tesoureiro:- Jorge Garcia Fialho
Secretário:- Mário Francisco Fernandes Escoval
Vice-Secretário:- Jacinto Reganha Pica
que, em Assembleia de 01/03/57 por intermédio do Secretário, Mário Escoval que expôs os prós e contras em adquirir a casa em questão,  se decidiu avançar com a compra da terça parte da casa ao lado uma vez que a restante  foi comprada pelo dono da outra casa contínua Dr. Figueiredo, cuja obra importava em 135.000,00 escudos mas com a compra da casa o orçamento aumentou mais 75.000,00 escudos, totalizando 210.000,00 escudos,  tendo sido aprovada por maioria.
Mas eis que com a obra concluída e inaugurada em 13/04/58 passei a estar nas nuvens graças aquele punhado de jovens que quiseram atribuir-me este bem-estar. 
Obra esta, considerada no tempo, como a Sociedade maior de todo o Alentejo.
Entretanto, em 16/01/59, depois da obra feita, a Assembleia Geral de sócios dá poderes ao Tesoureiro Jorge Garcia Fialho para contrair em nome da Sociedade na Caixa Geral de Depósitos um empréstimo até 100.000,00 escudos com garantia hipotecária do prédio. Usando da palavra o Secretário Mário Fernandes Escoval disse que aceitariam a autorização do referido valor mas com a condição de a mesma Direção se manter em funções até o fim da liquidação da hipoteca, que foi concedida.
Em 10/05/59 em Assembleia Geral e uma vez que estava em grande expansão a Televisão, novidade na nossa terra, a Assembleia debruçou-se sobre este assunto, que, atendendo as dificuldades financeiras havida com as obras e a compra da casa tornava-se impossível concretizar os desejos dos sócios. Mas eis que aparece uma proposta apresentada pelos sócios José Delgado D’Àbrio e António Pedro Sales Peres, em que puseram as condições de que colocavam uma TV usufruindo a importância de 0,50 cêntimos por sócio que quisessem ver, por dia, durante 2 (dois) anos. Terminado este período a televisão ficava a pertencer definitivamente a Sociedade tendo sido aprovada na referida Assembleia.
Outros casos houve… mas fico por aqui e dou voz aos meus seguidores que tracem uma resenha do que foram os tempos decorridos desde aquelas datas até aos dias de hoje.
 Assim, se tempos difíceis eram até aquelas datas maiores se tornaram a partir desta, segundo os dados que possuímos e são alguns, os tempos da ditadura só trouxe amarguras em especial para aqueles mais desfavorecidos, que eram muitos, com a falta de trabalho e o consequente êxodo emigratório para países da Europa e migrações para Lisboa e periferia e outras paragens, bem como com a guerra colonial a partir de 1960/61 a nossa juventude tiveram que deixar o nosso cantinho para servir o estado, originando uma desertificação acentuada na nossa terra e consequentemente a desistência de sócios desta coletividade por força das circunstância.
No entanto, os seus sócios continuaram a honrar o que os nosso antepassados nos legaram e continuaram teimosamente prevalecendo com a sua beleza o mesmo sentido de associativismo que nos deixaram.
Nesses tempos, desde 1958, data da inauguração deste edifício, e restantes eram exibidos no terraço e no salão da Sociedade, além de bailes e outros eventos, cinemas ambulantes e com a criação da televisão a Direcção adquiriu uma TV em circunstância atrás citada para os sócios pagando 50 centavos por sócio até que por força dos tempos e a criação de outras diversões a nível nacional e local foi-se deteriorando a permanência dos sócios na Sociedade originando um desinteresse que cada vez mais se veio notando até que chegou ao ponto de uma inabilidade tamanha que víamos caminhar a passos largos o seu término sem que houvesse alguém entre os sócios capazes de tomarem a iniciativa de arrumarem a casa e honrar aqueles que tudo fizeram por nós.
Até que, também aqui um punhado de sócios, não tão jovens, como os primeiros, julga-se, deitaram mãos a obra e fizeram renascer, não direi das cinzas porque não morreu, mas da situação precária em que se encontrava.
E é aqui que nesta breve resenha chegamos aos nossos dias.
Não há dúvidas nenhumas que esta Colectividade é aquilo que os seus sócios querem que ela seja. Para tanto é necessário que independentemente dos seus credos políticos exerçam os seus direitos e deveres junto dos Orgãos Sociais que dirigem os destinos desta Sociedade apresentando opiniões credíveis para torna-la cada vez mais Sociedade e evitar o seu definhamento, logo, a sua morte, ainda que nesta data esteja a funcionar em pleno.
Não é isso que queremos e já foi dito por várias vezes, mas uma SOCIEDADE que HONRE os nosso antepassados com este imponente legado que nos deixaram.
Para as camadas jovens que hoje pouco ou quase nada frequentam esta casa pede-se que, também vós, honrem os vossos antepassados que afinal são pais, irmãos, tios e outros familiares que já nos deixaram, dignificando-a com iniciativas que certamente todos vós têm.
PARA OS NOSSOS ANTEPASSADOS NESTE DIA DO 100º ANIVERSÁRIO DA FUNDAÇÃO DA SOCIEDADE O NOSSO MUITO OBRIGADO POR TUDO QUANTO NOS DEIXARAM, PRESTANDO-LHES ESTA HOMENAGEM PÓSTUMA COM UM MINUTO DE SILÊNCIO.
PARA OS SÓCIOS ACTUAIS, QUEREMOS SER OS SEGUIDORES DELES E TRANSMITIR AOS VINDOUROS OS DESEJOS DA CONTINUIDADE DESTA CASA.
BARRANCOS, 13 de Maio de 2019 - ass) José Peres Valério, Sócio nº 158
placas comemorativas colocadas na SRAB
(Foto: eB, 24-05-2019)

3 comentários:

romcadur@gmail.com disse...

Tudo quanto seja história é de guardar porque amanhà pode haver alguém que queira dizer o contrário ou omissão, muito bem o artigos ou artigos são informação para a história de Barrancos e da SRAB em particular. obrigado pela minha parte vou guardar.

Jacinto Saramago disse...

Caro Romão
O eB, para além de informar, serve de repositório da memória de Barrancos. Aqui pode encontrar um pouco do que sucedeu em Barrancos, desde 2006. Já lá vão uns anitos.
Abç

Anónimo disse...

Que história tão bonita