Sendo a palavra “iguala”, a terceira pessoa do singular
do presente do indicativo do verbo igualar, para o povo de Barrancos é-lhe
indiferente como verbo, para o caso que passo a citar. São apenas seis letras
que lhes diz muito.
Porque?
Porque nos faz recuar
no tempo. Décadas de 40 a 60 do século passado.
Como é do conhecimento
geral a saúde é um bem que qualquer cidadão prima nos dias de hoje sem esquecer
os de então. Um direito inegável. Um direito que, hoje, através do S.N.S.
(Serviço Nacional de Saúde) protege o povo na generalidade.
Como atrás se diz, a
palavra IGUALA, nas décadas supra, era o nome que se atribuía ao
acordado entre médico e utente para aquele prestar assistência médica aos
habitantes desta Terra. Como o povo era pobre, vivendo com dificuldades lutando
por todos os meios para angariar uns tostões para pôr na mesa a deficiente
alimentação, já por si subnutrida, para os seus filhos, o médico com o seu
altruísmo pôs em prática este sistema aliviando assim, um pouco, as canseiras
que as pessoas passavam, cuja contrapartida (Iguala) seria, consoante o
agregado familiar, paga em trigo ou em numerário, anualmente.
Eram tempos de muitas
doenças: crianças e adultos subnutridos com sarampo, papeira, gripes, tosse
convulsa, tuberculose, e partos, etc, a que o médico, Dr.
Fernandes, filho da terra, tinha que prestar os cuidados inerentes à profissão
durante 24 horas diárias no seu consultório ou levantando-se da sua cama indo à
casa do doente a qualquer hora do dia ou da noite, madrugada incluso, sem olhar
as intempéries que se lhes deparavam.
Também prestava
assistência médica na mina de Apariz, já com um grande aglomerado populacional,
que dista da vila aproximadamente 12 Km.
Mas esta situação não
se verificava apenas em Barrancos, mas por todo o interior do país continental, como nos
descreve o médico e escritor Fernando Namora, que ia de burro aos lugares mais
recônditos das serranias beirãs por caminhos de cabras, veredas, etc. consultar
os seus doentes porque não tinham meios para se deslocarem ao consultório.
Outros tempos! Tempos
difíceis para este e outros médicos do interior do país que profissional e
humanamente prestavam assistência a estas gentes indigentes, em especial,
porque era o grau social que predominava no concelho, sem olhar a esforços.
A vida para estes
profissionais, apesar da formação que possuíam, também era de sofrimento ao
verem pessoas assustadas, acanhadas, queixando-se quantas vezes a quererem exprimir
o que tinham, ora dor num lado ora noutro, e não conseguiam porque o
obscurantismo era total e tinha que ser o médico a adivinhar.
Casos houve, em que
tinha que se deslocar ao campo, a malhadas e montes, a ver pacientes que não se
podiam deslocar de burro ou outro meio, porque automóvel só para quem tivesse
muitas posses.
Como se depreende a
higiene era precária. Água canalizada
nem sonhar.
Chegado o mês de Julho/Agosto lá ia o Tio
Eduardo (espécie de cobrador) com o seu burro e o meio alqueire de porta-em-porta
receber as igualas do trigo, porque
em numerário era pago diretamente ao médico.
Após o falecimento
deste, outros se seguiram como o Zé D’Avó. O mais recente e talvez o último!
Tempos que, comparados
aos de hoje, existe uma diferença abissal. Hoje, outros tempos. Tempos de
evolução. Tempos que devíamos ter uma saúde bem melhor daquela que temos.
Foi com a conquista do
25 de Abril de 1974 que outros rumos se criaram dando origem ao SNS (Serviço
Nacional de Saúde), que infelizmente tão mal tratada é.
Barrancos, 16 de
dezembro de 2019
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