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Texto Paulo Barriga Fotos José Ferrolho, in Diário do Alentejo, 13-03-2015, on line
DA: "Acabámos de chegar a Barrancos. É sempre um verdadeiro
poema conduzir até aqui…
AT: É sempre uma dificuldade tremenda. Estamos no fim do mundo, como tenho dito
tantas vezes. Este ostracismo a que estamos votados por parte do poder central
e, neste caso particular, por parte da empresa Estradas de Portugal, é
sintomático. Querem, no fundo, que permaneçamos esquecidos no seio de Portugal
e isto não pode ser.
Trata-se de uma fatalidade?
Não! Vamos tomar posições mais drásticas não tarda muito. Sentimos que estamos
a ser relegados para segundo plano. Ou seja, sentimos que não pertencemos ao nosso
próprio País, ao nosso Portugal, o que é ultrajante para as pessoas que vivem
em Barrancos. Não se pode promover o desenvolvimento desta região sem boas
acessibilidades. Temos a melhor fábrica de presuntos que existe, a par de
muitas outras médias e pequenas fábricas disseminadas pelo perímetro da vila, e
é necessário escoar o produto, exportar. A Barrancarnes, a título de exemplo,
no ano passado teve um volume de negócios de sete milhões de euros. Isso quer
dizer alguma coisa. Sem boas acessibilidades isto corre o risco de se perder.
Que medidas “mais drásticas” serão essas?
Não sei, ainda estamos a pensar. Já fizemos todo o tipo de exposições a todo o
tipo de entidades, seja ao Presidente da República, ao primeiro-ministro, à
Estradas de Portugal, seja a entidades regionais… E o que é facto é que até
hoje não têm feito nada.
Está-lhe a ocorrer alguma forma de protesto mais veemente?
O que me ocorre é que a população vai ter de sair à rua em grande massa. De uma
vez por todas, isto tem de acabar. Queremos pertencer a este País, queremos ser
portugueses de facto.
Em dezembro foi falar com o secretário de Estado das Obras Públicas o que
trouxe na bagageira na sequência dessa reunião?
Nada! Não trouxemos nada, absolutamente nada, o que é mau. Para nós, trazer uma
mão cheia de nada, foi um insulto. Aliás, Barrancos e Almodôvar ficaram de fora
do plano de investimentos da Estradas de Portugal para 2015, o que quer dizer
que não estão minimamente preocupados connosco, nem com a segurança daqueles
que transitam nestas estradas.
O isolamento continua a ser a grande inquietação do autarca de Barrancos ou
há outras preocupações que também o assaltam?
Neste momento, o isolamento a que estamos votados é, possivelmente, a nossa
maior preocupação. E, depois, há as questões do desemprego, as questões
sociais, que são transversais a todo o País neste tempo de grande crise.
Sempre que se fala em “reorganização territorial”, Barrancos vem logo à
baila. Isso incomoda-o?
É algo impensável. É um tema recorrente por parte de pessoas que não têm a
mínima visão do que é o interior deste País. No momento em que acontecesse uma
situação desse tipo acabava Barrancos. É bom ter isso em conta. Apesar de se
dizer que já não há fronteiras, elas existem. Hoje as fronteiras são identitárias
e não físicas ou políticas.
Barrancos é uma espécie de “embaixada identitária” de Portugal no interior
de Espanha?
É mesmo! O caso de Barrancos é conhecido em todo o mundo. Trata-se de uma
comunidade com uma independência moral muito forte, uma autonomia que
transcende tudo o resto. A nossa fala, a nossa língua, a nossa identidade
cultural em termos de usos e costumes, mas também as nossas atitudes e ações ao
longo da história dizem isso.
Algo que escapa ao poder central…
Sabe que o poder central tem uma visão centralista em relação ao resto do País.
Isso não pode ser…
Considera que se impõe uma regionalização do território?
A regionalização foi uma oportunidade que se perdeu em determinada altura.
Agora também não sei se será viável, como diria o outro. É necessário ter algum
cuidado quando se fala da regionalização.
Como assim? Está satisfeito com a solução encontrada em gabinete? Com a
criação das comunidades intermunicipais?
Acho que é a solução possível neste momento. Mas também não resolve nada do
outro mundo. Penso que teria de haver alguma autonomia por parte das regiões e
não era esta a “regionalização” que nós queríamos, naturalmente. Digamos que as
comunidades intermunicipais têm um papel agregador dos municípios que as
compõem, no sentido de possibilitar políticas comuns. Mas não vai muito além
disto. Tem de existir muito mais autonomia em termos financeiros e em termos
políticos.
Passou há pouco tempo na Assembleia Municipal de Barrancos a intenção de a
autarquia contrair um empréstimo para financiar o plano de regeneração urbana
da vila. No que consiste este plano e quanto dinheiro está envolvido?
Trata-se de um empréstimo muito pequeno, na casa dos 400 e poucos mil euros.
Neste plano vamos abranger as zonas principais do centro histórico da vila e
também as áreas circundantes, nomeadamente o acesso ao parque de feiras e
exposições, ao cineteatro, ao polidesportivo, ao campo de futebol, às piscinas
municipais. Iremos repavimentar essas artérias e colocar algum mobiliário urbano
para dignificar a parte nobre da vila.
Alguma vez se sentiu tentado a aceitar a proposta do Governo de
descentralização de competências, nomeadamente na área da saúde?
Sabemos que os governos não são bons cumpridores, como tal, a nossa posição é
que sem dotação financeira compatível, sem garantias em termos de futuro e em
termos de empregabilidade, não vamos aceitar nada. Somos frontalmente contra
este tipo de situações. Os municípios devem ter a sua autonomia e não assumir
competências de outrem sem garantias de nada.
Falei em concreto da saúde porque o Centro de Saúde de Barrancos fecha às
cinco e meia da tarde e aqui poderia haver uma possibilidade de alargar o
horário de funcionamento até às oito horas, pelo menos…
Sabemos pela experiência passada e recente que, de facto, não há condições para
assumir novas competências. Embora as autarquias as assumam de outra forma. Já
nos substituímos ao próprio Estado quando assumimos em Barrancos a abertura do
centro de saúde ao fim de semana. É um grande encargo para a câmara municipal.
Fazemo-lo com todo o gosto, porque está em causa a própria população de
Barrancos e isso para nós é sagrado…
Ainda há bem pouco tempo as crianças de Barrancos tinham que levar a vacina
da BCG em Moura ou em Beja…
Estamos neste momento à espera da colocação de uma enfermeira, uma vez que uma
das nossas profissionais foi para o Instituto de Oncologia e agora faz-nos uma
falta tremenda. Estamos em contacto com a Administração Regional de Saúde e com
a Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo, no sentido da resolução imediata
deste problema. Queríamos também que houvesse mais um médico. Barrancos poderia
e deveria ter dois médicos. Mas fazem por lá aquela contabilização do número de
habitantes e pensam que um chega. O que não é verdade. Não se trata de uma
questão meramente económica, é uma questão social e, acima de tudo, de atenção
às famílias.
Está aí à porta a ExpoBarrancos, feira dos presuntos e enchidos. Esta
continua a ser a principal área económica do concelho de Barrancos, ou tem
sentido nestes últimos tempos que outras empresas se querem instalar aqui no
concelho?
O problema foi a crise que sobreveio em 2011. Naquela altura tínhamos três
investidores potenciais do lado espanhol para se instalarem em Barrancos. Com a
história da crise, o medo foi tanto que e os dinheiros também não chegaram e
essas pessoas foram-se embora. Mesmo assim, durante este período de crise,
surgiu uma nova fábrica de presuntos, a Sabores de Barrancos.
O último mapa do Instituto de Emprego, em relação a Barrancos, dizia que
havia 121 pessoas no desemprego. É um número preocupante para a realidade
barranquenha?
Em Barrancos há desemprego, como o há em todo o lado. Mas aqui a parte social é
muito melhor vista, porque nós ajudamos, seja de que forma for, as famílias, no
sentido de que não haja aquele tipo de necessidades tremendas que há em muitas
zonas do País. Aqui não há fome, nunca houve fome, mesmo nos tempos do
fascismo, porque as pessoas são muito solidárias.
Que papel desempenha a autarquia neste quadro?
A câmara municipal, como representante máxima desta comunidade, tem de ser
muito mais solidária e é o que está a acontecer, naturalmente. Temos programas
de apoio, seja a nível de parcerias com o Instituto de Emprego, seja
propriamente com as associações do concelho. Há aqui um apoio efetivo…
A solidariedade faz parte da tal “identidade” de que há pouco falava?
É verdade! Mas, já agora, deixe que lhe diga que aquele desemprego que se fala
estatisticamente, aqui, em Barrancos, não é bem assim… É claro que quereríamos
e gostaríamos de arranjar emprego para toda a gente que passa por casos,
digamos, episódicos, de desemprego…
O desemprego costuma ter impacto na natalidade e na evolução demográfica…
Em Barrancos houve mais nascimentos no ano passado! Tivemos 16 nascimentos, o
que é muito bom, tendo em conta os nossos apoios e tudo o mais. As famílias
pensam também fixar--se nesta terra e isso é muito importante. Existirem casais
jovens que querem residir aqui, que não querem sair, para nós é uma responsabilidade
dupla. Obriga-nos a arranjar soluções em termos de empregabilidade desta gente,
a pensarmos no futuro desta gente, porque é o futuro da comunidade que está
neste momento em jogo.
Inauguração do largo
Tenente António Seixas
Este sábado, 14, pelas 16 horas, o antigo largo da Adua, no coração do típico
bairro do Cerro, em Barrancos, passa a chamar-se largo Tenente António Augusto
Seixas. Uma homenagem não apenas a este militar da Guarda Fiscal que em 1936
evitou que mais de um milhar de refugiados republicanos da guerra civil
espanhola tivessem sido executados, como a “toda aquela solidária gesta
barranquenha”. Na ocasião será ainda inaugurado um monumento alusivo à
efeméride, onde consta um painel em alto-relevo esculpido pelo artista plástico
barranquenho Zandre."
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